terça-feira, 12 de julho de 2011

Pico Ciririca, a travessia por cima até o K-2 paranaense

   Três dias de caminhada sobre vegetação baixa, vales, florestas, campos de altitudes, repletos de lindas paisagens e de companheirismo...
               Modéstia a parte, se a trilha até o Ciririca já é temida, porque não fazê-la por um jeito mais dificil?
          Após a baixa de um dos companheiros, Luiz Suzuki que já havia ido até o Ciririca pela trilha de baixo 2 semanas antes em companhia de outros amigos seus, ficamos apenas Roberto e eu para realizar o projeto de meses ( ou anos) atrás.
          Resolvi ajeitar a mochila na noite que antecedia o dia de saída, e quando fechei a mochila pela primeira vez achei relativamente leve, lembro-me de uma coisa aqui e outra ali e o peso foi aumentando. Ao final, fui socando coisas... A mochila ficou, sem relatividade, muito pesada.
     Combinado os acertos finais, saimos do trevo do Atuba, as 7:25hs do dia 08/07/2011 em direção a Fazenda da Bolinha, Bolinha era uma cachorra, já falecida, que acompanhava os montanhistas até o cume do Ciririca.
     Após os preciosos alongamentos, as 8:30 hs, tomamos o rumo da trilha, que na primeira hora é a mesma tanto para a trilha por baixo quanto por cima.
     Às 9:45hs hora de tomar a esquerda na bifurcação em direção ao primeiro cume da travessia - o Camapuã - logo depois da mata erigimos na longa rampa rochosa desse píncaro. Com algum esforço, com mochilas cargueiras, chegamos no ápice do Camapuã e sem demora tomamos o caminho para o vale que separa o Camapuã e o Tucum, segunda montanha do dia. Mostrei apenas a direção para o Roberto de uma bica que fica nesse selado, pois preferi mostrar "in loco" a gruta com água que fica na encosta do Tucum à esquerda da trilha.
     A partir deste cume é que a coisa fica brava, pois a descida desse vale é muito ingreme e extensa. Em exatos 2 meses antes, já havia feito um ataque até o Cerro Verde para verificar o caminho que seguiria meses depois, deixando inclusive água no cume em caso de alguma emergência.
     Inicialmente, o plano era para acamparmos no Luar. Deixaríamos as mochilas na bifurcação CERRO VERDE/TUCUM/ LUAR, e seguiríamos até o cume do Cerro Verde mais leves e, lógicamente, mais rápidos. Essa bifurcação é praticamente um trevo: Forma-se um T: para quem vem do Tucum,  depara-se com uma trilha perpendicular, a direita segue-se para o Luar e Meia-Lua, a esquerda segue-se para o Cerro Verde e Itapiroca.
     Quando chegamos nesse "trevo", ponderamos que já se fazia tarde e não alcançaríamos o cume do Luar, que para mim era desconhecido, ainda com os raios solares. Tomamos, acredito eu, a decisão mais correta de toda a caminhada: armar acampamento no Cerro Verde. Tinhamos água, pois já havia deixado no cume, eu conhecia o lugar, portanto, sabia que ali o pouso seria tranquilo.  Passamos pelo cruzo do Itapiroca que segue à esquerda da trilha até o Cerro Verde, já um tanto cansados da caminhada. Quando chegamos na área de acampamento, que fica a uns 50 metros do cume, já era por volta das 16:00 ou 16:30hs. Justifico-me, mesmo não precisando, de nossa demora: Com mochilas pesadas, tínhamos comida de sobra e tinhamos em mente 1 dia a mais de caminhada e ainda mais um dia de reserva, em caso de algum percalço grave, portanto tempo não era nosso problema. Ao chegar na clareira, Roberto não queria mover nem um músculo a mais sem necessidade, mas incentivei-o a largar sua mochila e seguir ao cume do Cerro Verde, o centro do espetáculo!
           Durante toda a caminhada havia falado para meu companheiro que lhe mostraria a magia que cerca esse cume, e quando estávamos  no alto no Camapuã em direção ao Tucum, fiquei um pouco perturbado ao acompanhar as nuvens vindas do litoral batendo nas paredes do Ciririca, logo depois nas encostas do Luar e fechando essa porção serrana... Bem...acontece que restou a visão aberta apenas do Itapiroca e do Tucum... Espetáculo em 1 ato. O cume do Cerro Verde fica bem no meio da serra do Ibitiraquire, dele avista-se com perfeição o Conjunto Ibiteruçu ( Ibitirati, União, Pico Paraná, Tupipiá e Camelo), o Tucum, Pedra Branca, Morro do 7, o conjunto Marumbi (Esfinge, Ponta do Tigre, Gigante, Olimpo), a baía de Paranaguá, Antonina e o porto (ponta do Félix), Caratuva, Itapiroca (que parece um vulcão adormecido), Luar, um pedaço do Agudo da Cotia e, nosso objetivo maior, o Ciririca.  Livro de Cume assinado, após breve lanche, começamos a ajeitar o acampamento e nossa refeição. Os olhos sempre estavam voltados para elas: as Placas que assinalam o cume do Ciririca.
Roberto com olhares voltados ao grande objetivo: o Ciririca.
     O amanhecer trouxe-nos a surpresa: um dia claro e sem nuvens... Acampamento desmontado e as 8:35 hs estávamos nos despedindo do cume do Cerro Verde em direção a bifurcação que havíamos deixado para trás no dia anterior. Após 1 hora, começamos a galgar pela, então desconhecida por ambos, trilha que leva em direção ao Luar.
     Aqui vale um precioso adendo: Os poucos relatos que existem dessa travessia, pouco dizem acerca da trilha. Pontos de água, rumos, vegetação, entradas, etc... Ficava intrigado com essa escassez de informação. Hoje entendo o porque: Não há nada o que dizer, pois não existem muitos pontos de referência... É uma trilha estranha, que às vezes toma rumo diferente do esperado, existindo muitas roubadas. Uma delas foi descrita por Mikael Arnemann, dizia ele em seu espaço internético ( http://altamontanha.com/blog/mikael/ViewItem.asp?Entry=11 ) que :  "...Após andar um longo trecho descendo, com várias bifurcações à direita que levam ao Tucum, chegamos num ponto onde se tem a certeza de que a trilha segue reto em frente. No entanto, esta faz um cotovelo e segue 90° para a direita. Pouco mais a frente chegamos num rio..."     Não adianta, se você não foi anteriormente com quem conhece, você passará reto nesse ponto, a não ser que alguém tome uma atitude de marcar a roubada; a trilha vai reto caindo num vale e... simplesmente acaba! Outro ponto, mais adiante, é que descendo os campos de altitude, quando se acha que a trilha (bem batida, nesse ponto) toma a direita e entra num pequeno vale, ela.... isso mesmo: some! Volte a alguns metros e verá uma tênue linha, pouco batida, de trilha que segue a esquerda... Esse ponto é confuso e perigoso. Ficamos mais de meia hora procurando a trilha. Com certa experiência, achamos a tênue linha que havia dito acima. Portanto, cuidado!
     Chegamos ao cume do Luar as 11:30hs, que é apenas uma pedra com caixa de cume e nada mais. Aliás, a caixa de cume estava sem tampa, com o fundo um pouco quebrado e sem livro de cume e sem caneta. Tomei as seguintes providências: coloquei um livro de cume novo, porém se alguma alma caridosa tomar a iniciativa de ir a esse longinquo cume, levem canetas para deixá-las lá... Também improvisei uma tampa para a caixa, com o fundo de uma garrafa pet cortada e encaixada, como uma medida remediativa urgente, cambiarra pura! Nesse momento, percebi que acampar no Cerro Verde tinha sido uma boa, pois não há lugar para acampar no cume do Luar, existe sim uma área, improvisada, já longe do cume em direção ao Última Chance... 
     Bom, depois de descer o campina da crista do Luar, entrará em um vale extenso, subindo outro morrete e entrando novamente na mata em direção ao Ultima Chance, daí não tem erro, caminha-se por dentro de um rio, mais um pouco de mata e entra-se em outro rio: O Ùltima Chance! Minutos depois encontrará o cruzo com a trilha que vem de baixo. Vindo do Luar a trilha parte para a esquerda, subindo, em direção ao Ciririca e a direita novamente para a bifurcação com a trilha de cima. Abasteça-se com água aqui. Logo em seguida, seguindo a esquerda para o Ciririca, começa uma pequena rampa e entra-se novamente num vale, que no fundo tem um pequeno riacho. Acredito eu que nos dias mais secos não há água nesse local.
          Subindo um pouco mais, encontramos a temida Rampa do Ciririca, alguns defendem a "grampeação" desta parede, o que acho uma tremenda de uma idiotice... Em dias de chuva, talvez ela se torne um problema, mas caso contrário, a rampa é vencida sem problemas com um pouco de esforço, prudencia  e paciência. Subindo aos poucos por uma crista, chega-se ao cume do Ciririca e enxerga-se as famosas Placas de aço.
           Andamos mais um pouco e chegamos a 1a.placa, mais alguns minutos de caminhada pela vegetação herbácea e as 17:45 hs. pisamos na área de acampamento, que fica exatamente ao lado da 2a. placa.
           Antes de qualquer coisa, Roberto e eu fomos cumprimentar as pessoas que já estavam no cume, gesto de civilidade e respeito.  Contei 7 barracas no cume e fiquei pensando que com aquele tempo, seria óbvio que montanhistas não quisessem ficar em casa assistindo TV. Fomos indagados se éramos a dupla que estava vindo pela trilha de cima, logo após a afirmativa, fomos cumprimentados pela "façanha" e coragem. Essa trilha, em alguns momentos, se torna quase que mítica, pois existe um certo temor em executá-la, embora em idos passados, essa trilha era muito menos frequentada e quase "impossivel" de se realizar. Após um dedinho de prosa com o pessoal, começamos a armar acampamento e fazer a "bóia", pois o sol já havia se escondido atrás do Tucum. 
           Roberto pegou o livro de cume para que deixássemos nosso registro. Meu companheiro, em geral, faz seu registro da seguinte forma: data, horário de chegada, nome completo e só. Dessa vez foi diferente... Empolgado, escreveu 2 páginas, pois essa conquista tinha um gosto totalmente especial! Com as coisas ajeitadas e com a barriga forrada, pegamos nossos sacos de dormir e ficamos deitados em uma laje de pedra bem ao lado da placa, conversando e olhando para o céu, que estava estupendo, tendo a lua crescente pendurada no firmamento.
          Após algumas conversas com o povo que estava por lá, acabamos sabendo que naquele dia estava acontecendo um evento da AMC (Montanhistas de Cristo), e naquele ápice estava indivíduos como o Jopz e o Beto, que conhecia apenas virtualmente, através de e-mails em listas e nos meios orkutais; lá estava também Alex, que conheci pessoalmente, pois algumas semanas antes tinha ido até o escritório onde trabalha, adquirir rádios comunicadores. 
          A noite foi tranquila, e como não podia ser diferente, Roberto e eu fomos até a 1a. Placa para ver o nascer do sol e também, como não podemos deixar de fazê-lo, subimos na placa, ver o visual lá de cima... Sonho de qualquer um que chega ao cume do Ciririca. Sem muitas delongas, às 09:35, saímos em direção ao Última Chance. Ao chegar lá, ao invés de retornarmos pela trilha de onde viemos, começamos a andar pela famosa "trilha de baixo", desconhecida tanto pelo meu companheiro quanto por mim. 
          A trilha segue hora subindo, hora descendo e após algum tempo, chegamos a "Pedra da Corda", um lance meio estranho de passar, ainda mais com cargueira, mas que é vencida com a ajuda de uma corda, que dá nome ao lugar. A trilha passa por lugares "mágicos", como o Poço das Fadas, que faz jus ao nome e dá a impressão ao transeunte que logo passará uma fada voando ou um duende a seus pés. Se trata de um grande anfiteatro de pedra, dois ou três rios que vem de direções distintas e que formam pequenos poços e cascatas. Uma magia, um lugar de encher os olhos.
Outro lugar interessante é conhecido como Cachoeira do Professor - Erwin Gröger, austríaco, orquidófilo, músico, poeta, pintor, agrônomo, escalador e tantas outras coisas, que teria que escrever  um texto somente para ele, é conhecido como Professor porque ao frequentar o Marumbi começou a ensinar, para a gurizada que começava a desbravar a Montanha Azul, as técnicas alpinas de escalada que aprendera na Europa. Morreu na sua mocidade, aos 96 anos, em 2008- A cachoeira é uma homenagem ao homem que andava por lá coletando orquídeas e bromélias e que, dizem alguns, foi quem abriu essa trilha até o Cume. (não é informação oficial, não tenho certeza do que estou escrevendo).
          Outro ponto interessante, e digo até perigoso, é quando nos deparamos com um grande vespeiro. As queridas amigas, no intuito de proteger seu lar, nos deram 4 presentes no Roberto e 2 em mim. Se fossemos alérgicos... hummm... Perigo na certa! 
          Algumas considerações: Não tenho certeza, mas acredito que a AMC " adotou essa montanha. Fico me perguntando o porque em alguns trechos o facão não é usado para abrir a trilha em lugares onde a taquaripoca tomou conta do pedaço, obrigando os montanhistas a tirar suas mochilas das costas para poder passar através do enlace. Abrir essas veredas de modo algum tira a dificuldade da trilha e também evita que sejam feitos desvios, resultando em um maior impacto. Outra coisa que percebi é o multicolorido e a excessividade nas fitações que estão sendo feitas por lá. Esclareço-me: Quanto as cores, existe uma "convenção", fazendo com que a trilha do Ciririca por baixo seja de cor Laranja, lá percebi azul, laranja, amarelo, verde, vermelho, sem contar nas sacolinhas plásticas. No início da trilha, existem dezenas de fitas amarelas, que foram colocadas, se não me engano, pelo pessoal do "Minhocas da Terra" (me perdoem se estiver errado). A intenção é ótima, mas as amarelinhas estão colocadas onde não há risco de dúvidas. Lugar confuso sim, é da bifurcação Tucum/ Cerro Verde até o vale que antecede o Última Chance, como expliquei acima. Acredito que atitudes simples terão um efeito ótimo nessas paragens. Se eu for dar uma andada por aí de novo, como já conheço a trilha, vou dar uma contribuição. Por falar no "Minhocas da Terra", providencial, necessário e louvável a atitude dos mesmos de colocar novas placas indicativas no cruzo Tucum/Ciririca; as plaquinhas antigas já estavam quase que deterioradas por completo e quase não oferecia sua real função: informar. Parabéns a eles!
           Bom, tentei colocar em pormenores tudo o que vi e percebi, mas acreditem, não chega nem a 20% de tudo. Aliás, um aviso aos incautos: embora as palavras aqui sejam amenas e a travessia seja de uma beleza singular, o negócio não é tão fácil quanto parece. Senso de navegação e orientação, conhecimento prévio de outras montanhas da região, dicas, relatos, experiência e preparo físico, são importantíssimos para que essa belíssima caminhada não se transforme em roubada, ou algo pior...
          Portanto, ficamos assim: Até a próxima, vou relatando minha vida, enquanto eu estiver ANDANDO POR AÍ... 
Com vocês, o vídeo oficial da aventura. Aproveitem!

5 comentários:

JOPZ_B1B disse...

OPAZ, grande pernada essa "por cima", está na lista para percorrer um dia, parabéns para a dupla Koz/Roberto.

O tempo estava realmente muito bom e foi um final de semana incomparável e inesquecivel na montanha.

Quanto as vespas... ESCAPAMOS POR POUCO, fugimos dela fazendo un desvio por dentro do bambuzal seco, um vara-mato não programado mas que salvou nosso lombo... várias chegaram a nos atacar, mas por sorte pegaram nas mochilas, na calça ou nos cabelos sem atingir a pele... dessa vez demos sorte (já na ultima pernada ao salto dos macacos fomos carimbados até a alma).

JOPZ

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Faz tempo que estou ensaiando pra fazer essa famosa trilha de cima, mas como sempre estou sozinho acabo adiando e me contentando em ir por baixo. Se puder me passar algumas dicas além das que estão no seu blog do caminho entre o Tucum e o Luar ficarei muito agradecido.

Henri's page disse...

Bacana

Henri's page disse...

Bacana