quarta-feira, 28 de março de 2012

Tupipia... -- Uma montanha para poucos –

         Quando comecei minha vida montanhistica, no ano de 2008, subindo o Pico Parana, olhei a extensão sul do cume e senti-me atraido. Chamou-me a atenção aquele pontão, unido ao conjunto por uma curta sela. Com algumas pesquisas, descobri que sua conquista se deu por Rudolf Stamm (Marumbi), após 4 anos da conquista do seu irmão mais velho: o majestoso Pico Paraná. Com uma caminhada de 2 horas, abrindo o mato, em 1945 chega o primeiro montanhista para alcançar seu ápice.
          Com mais um convite dos meus amigos Alex, Jamil e Josafat (Cachorrões da Serra), vejo-me na tentativa da conquista de um dos meus sonhos: chegar onde Marumbi havia pisado em 45.
          Certo de que não era missão fácil, pois havia logrado falha de atingir o cume um mês antes, estávamos na incumbência de devolver o livro de cume que jazia em sua caixa metálica, molhado e com poucas assinaturas, que na semana anterior havia sido resgatada por Jamil e Josafat. Ao que me foi relatado, a caixa de cume havia sido instalada em 1997, a ultima assinatura era de 2007: a terceira!
          Na semana que antecedia os dias 24 e 25 de Março de 2012, acertamos os detalhes para a investida. Alex levaria sua amada, Talita, para o Pico Paraná, em companhia de Josafat e Low. Eu os acompanharia ate o cruzo do Caratuva, de onde seguiria rumo ao cume desse pico (1860m.), descendo em seguida pela trilha da conquista do PP ate o Abrigo 1, me encontrando novamente com meus confrades, seguindo encosta acima para o Abrigo 2 e, no outro dia, rumando para o cume do Pico Paraná (1877,33m.) e Tupipia (1727m.) Jamil, por sua vez, ascenderia na manhã de domingo, de ataque para se livrar da incumbência de deitar o livro em seu leito de direito.
          Chegamos à Fazenda Pico Paraná as 09:10hs do dia 24. Julgando meu percurso um pouco mais estafante, pedi licença para meus camaradas para que eu pudesse seguir antes deles para meu caminho. As 9:40 hs, parti de cargueira para o alto do Morro do Getulio (Piolho), onde julgo ser o pedaço que “quebra a perna” do montanhista, devido ao desgaste empreendido para ultrapassar essa barreira natural.
          Ao chegar no cruzo do Caratuva, larguei minha cargueira e demorei-me num descanso merecido, a fim de não me estafar sem necessidade. Durante 20 minutos de parada, pude observar os beija-flores em suas danças, que por vezes são brigas ferrenhas, dado o gênio territorialista desse pássaro. Quando alcancei o primeiro mirante da trilha, observei o ultimo integrante da fila, Low, descendo para o cruzo do Caratuva, contatei-os por radio e desejei-lhes boa caminhada, uma vez que seguiriam pela direita na bifurcação e não teríamos muitas chances de contato.  Parada efêmera para conseguir o recurso hídrico, tão necessário, pontualmente as 13:00 hs, cheguei ao cume do Caratuva, e percebi que o conjunto Ibiteruçu havia acabado de ser fechado pelas nuvens vindas do litoral. Estagnei-me 20 minutos no cume, e após tentativa de contato com meus amigos, uma voz ressoou pelo radio, identificando-se como Álvaro Vitto, um montanhista de só conhecia virtualmente. Com promessas de nos conhecermos em ocasião vindoura, provavelmente no dia posterior, havia comentado que estava rumando para o Tupipia, e fiquei acompanhando, via radio, de sua investida, que não logrou êxito, devido ao mal tempo e a pouca informação que ele detinha.
          Com 1:20 hs de descida, cheguei ao ponto marcado de reencontro, o Abrigo 1, fiquei cerca de 40 minutos na espera dos companheiros. Breve descanso, iniciamos a subida para o Abrigo 2, não antes que um temeravel chuvisco, prometendo indesejável chuva, nos assaltasse pouco antes dos grampos.
          Sob chuva mais grossa, montamos acampamento, e durante a noite, pudemos vislumbrar a nova modalidade de montanhismo aquático, pois Alex obrigou-se a mudar sua barraca de posição após alagamento.
          Após alvorada, Jamil chega as 9:30 hs, após 2:50 hs de percurso da Fazenda ate o Abrigo 2. Acampamento desmontado, despedi-me de meus amigos que foram desmotivados pela chuva e pelo mal tempo, e retornariam para Curitiba. Desafio aceito, Jamil e eu, as 11:40 hs saímos para o cume do PP, fazendo breve parada para o almoço. Digno de nota, são duas situações: a primeira é o fato de “achados e perdidos”, achamos caídos na trilha, alem do habitual lixo, um canivete, uma blusa de lã, um boné, uma lanterna e também uma esteira de praia deixada intencionalmente dentro da casa de Pedra; esses objetos foram devidamente devolvidos aos seus proprietários. Outro fato interessante é que, meu leitor atencioso já deve ter percebido e deve notar nas linhas subseqüentes, são os horários fechados, fiquei intrigado como os horários sempre apresentavam o numeral 40.
          Chegado ao cume do PP, saímos as 12:40 hs e após 1 hora , as 13:40 hs alcançamos o ponto alto da atividade.
          A trilha que sai do lugar conhecido como banheiro do PP, inicia-se com um salto de um barranco, seguindo por uma mata fechada que se regozija em nos arranhar o corpo, deixando ferido, principalmente, os braços e o pescoço.  Metros a frente começa o martírio, uma descida íngreme e lisa nos recebe ao lado dos paredões do lado sul do Pico Paraná. Não se sabe o que é pior, a descida ou pensar na subida de retorno por aquelas paragens. Apenas para critério de comparação, essa trilha, devida sua descida abrupta, deixa a descida Tucum-Cerro Verde parecer brincadeira de criança. Uma quiçaça formada por caratuvas, vegetação alto - montana e vegetação nebular, seguido do alcantilado ladear dos paredões, forjam a vereda para alcançar a solitária caixa de cume. Ali, nos 1727 metros, encontramos oscilando tranquilamente com o soprar do vento, sobre duas caratuvas, um ofídio de porte pequeno e amarronzado, sem nenhuma preocupação, esquentando seu arrefecido corpo.
          Após 1 hora no cume, contemplando as paredes que insistem em nos tirar o fôlego, saímos em direção, novamente, ao cume do PP, as 14:40 hs chegando ao referido local as 15:40 hs. Livro assinado, hora de voltar para a marcha. Com passos diminutos, Jamil foi contendo seu ritmo, para amenizar a desvantagem entre ele, de ataque, e mim, de cargueira. Com o cansaço batendo, em condições atípicas, com peso e já com a falta de claridade, em um momento inesperado, errei o passo e rolei barranco abaixo, uns 2 a 3 metros, por sorte, meu anjo da guarda estava a me amparar e não sofri nada alem do susto.
          Como era de se esperar, chegamos a Fazenda Pico Paraná as 21:40 hs, onde encontramos uma pessoa que, segundo nosso julgamento, estava mais cansado do que nós; uma vez que, mesmo com chamados e buzinas, continuou com seu acalentador sono no banco que figura ao lado da casa de apoio. Sem maiores problemas, chegamos em Curitiba satisfeitos, recebendo as felicitações posteriores de amigos pelo feito.
          Assim foi a subida ao Tupipia, a montanha para poucos. E se você já foi la, meu amigo; parabéns! Isso é raro...