segunda-feira, 11 de junho de 2018

Série Personalidades - Edemilson Pereira

   
     No final da Estrada de Anhaia, na região do Cabrestante; encrustado nos contrafortes da Serra do Mar está o Sitio Vanessa. O nome do Sítio não foi escolhido à toa. Presta homenagem à uma graciosa menina (sobrinha da nossa personalidade), que teve a existência das rosas.



     Quem passa por ali pode ouvir o murmurar do Rio dos Padres, que bordeja a propriedade da Família Pereira. Importante curso d'água, ao passar seu límpido líquido por entre as pedras cobertas por musgos, deixa uma beleza cênica de encher os olhos.
     Mas não se engane: vez ou outra esse esplendoroso presente da natureza deixa de lado seu viés calmo e tranquilo para transformasse em uma força incrível; levando rochas, árvores e todo material que suas águas possam tocar. 
De certa forma é o rio fazendo a limpeza de todo possível labéu do seu entorno. Então, quando o serviço está terminado, volta resiliente ao seu estado normal.
     Talvez, o menino, nascido e criado nestas paragens em 22/10/1969, após tantas vezes olhar o rio - o seu rio - tenha visto também sua imagem refletida; entendendo que ele e o rio sejam quase um só.
     Josefa de Lima Pereira é a matriarca da família que, juntamente com seu finado marido Felisbino Pereira, com muito esforço criaram seus sete filhos.
    Juntos, os 7 irmãos e a matriarca, são os proprietários do Sítio Vanessa.
     Entre eles estava um que viria a se tornar o guardião de toda a região, situação que vai muito além dos limites de seu terreno. Edemilson Pereira é um entusiasta, e logo você entenderá o porquê...
     Acordava seus sobrinhos às 6 da manhã para irem juntos ao labor do roçado. Contra impropérios revoltosos e queixas indignadas de seus pupilos, ia "carinhosamente" (ou não) dando  através de exemplos (e talvez outras coisas também) a grande lição sobre compromisso e responsabilidade. Estava sob sua guarda e comprometimento ensinar-lhes e sob sua tutela fazer-lhes aprender.
     Carinhosamente, ensinou seus jovens sobrinhos a proteger o que é necessário. Responsabilidade que levou a cabo, nem que fosse fazendo e mastreando com as próprias mãos, junto com eles, os palanques de concreto que hoje cercam o Sitio Vanessa.
 A união que hoje se vê na Família Pereira mostra que os esforços valeram a pena. 
     Mas a região do Anhaia ficou pequena demais, e ele precisava ir mais longe para ajudar os familiares no sustento da casa. Em Morretes, tentou ganhar o pão de cada dia em algumas empresas do município. Logo após, iniciou atividades em um trabalho modesto em uma gráfica no centro da cidade. Talvez, inicialmente, o chefe tivesse até ressalvas quanto à contratação daquele rapaz, mas foi logo seduzido pelo jeito sério, ético, meticuloso e comprometido ao trabalho que Edemilson demonstrou. Não demorou muito para que o trabalho modesto se transformasse em grandes responsabilidades e ele se tornasse uma espécie de "braço direito" da empresa.
     Incansável, nos momentos de descanso "carrega pedra" literalmente - Quando o conheci, ele estava executando o seu projeto para uma possível enchente na região. Portanto, construiu um valo, todo murado para que as águas fossem canalizadas de forma segura para fora de seu terreno, protegendo assim, a si, seus vizinhos e os acessos em uma possível situação calamitosa. - Logo amigos vieram e o foco mudou. Quando a situação do muro estava tranquila, ergueu praticamente sozinho quatro enormes coberturas para proteção e comodidade contra as constantes chuvas da região. Ainda, lembramos que a manutenção de todo o sítio é feita pelas mãos fortes e seguras dele, travando batalhas ferrenhas contra o capim e as quiçaças que ameaçam a beleza do lugar. Quando lhe sobra tempo, gasta-o com sua horta e com os cuidados da grande quantidade de animais domésticos (seus ou não) -  esse é o grande amor de toda a Família Pereira.
     Aliás, o Edemilson é digno de grande menção, afinal é um enorme protetor da natureza. Detentor de grande consciência ecológica e ambiental, além de proteger a fauna e a flora diretamente, expande seu amor e seu conhecimento pela comunidade local. Em um de seus inúmeros projetos, executa anualmente uma atividade com as crianças das escolas municipais das comunidades próximas, bem na Semana Mundial do Meio Ambiente, mostrando in loco, através de um passeio em sua propriedade, a importância da preservação. Ali, convida os pequenos a ajudarem na sua empreitada espalhando além das sementes de palmeiras pela mata (sementes estas colhidas por ele e seus familiares nas semanas antecedentes ao evento) também as sementes que irão brotar na cabeça ainda em formação dos jovens: a consciência de que todos somos uma pequena parte de um grande todo, e que somos todos responsáveis pelo equilíbrio desse sistema. 
     Além disso, promove junto com amigos, anualmente, uma festa de final de ano para os pequenos, levando calor, amor, encantamento e empatia aos pequeninos que agradecem com brilho nos olhos e abraços apertados.
     Mas o fôlego da nossa Personalidade não acaba por aqui, ainda sobre a questão Comunidade, foi um dos fundadores da Biblioteca Comunitária Sítio Vanessa. Uma ideia genial que você pode saber mais no link abaixo:
http://rafakoz.blogspot.com/2012/02/biblioteca-comunitaria-sitio-vanessa.html
Edemilson Pereira - Pedaço do acervo da  Biblioteca e o valo murado construído pelas suas próprias mãos.

     As atividades e os projetos relacionadas ao meio ambiente são tantos que renderiam um texto enorme só sobre esse tema. Aliás, há inclusive, um trabalho de conclusão de curso pela UFPR que trata sobre as atividades e a importância do Sitio Vanessa e dos seus proprietários para o ecoturismo e o conservacionismo da região.
     Edemilson sempre está atento com as situações que podem oferecer riscos à comunidade onde vive. Faz parte da sua rotina monitorar as encostas, estradas e outros pontos vulneráveis. Faz o que a maioria dos brasileiros deveria fazer pelo bem comum: olhar, zelar, intervir, orientar e cobrar providências das esferas superiores - as quais elegemos para, na verdade, olhar pelo coletivo e não pelo individual. Não é de se estranhar que foi ele quem percebeu uma grande rachadura se iniciando na encosta do Viaduto dos Padres (BR-277, na ligação Litoral-Planalto Paranaense). Após se colocar à disposição para eventuais explicações e após algumas INdisposições com alguns envolvidos na situação, conseguiu, juntamente e através do Ministério Público, que uma grande obra de infraestrutura fosse iniciada no local.
     A propriedade de sua família faz divisa com o Parque Estadual do Pau-Oco, casa do Caminho Colonial do Arraial e do Salto Fortuna. Portanto, é normal ver esse laborioso homem dando dicas e avisos sobre segurança aos incautos visitantes que por ali passam. Criado na região, sabe bem, através do que viu e ouviu dos antigos sobre aquele importante traçado, qual é o valor histórico do Caminho, sendo por mim, considerado um grande guardião arqueológico. Nutre um carinho e um respeito muito grande pelo que é antigo, tendo em seu acervo algumas peças garimpadas e adquiridas em garagens, ferros-velhos e outras paragens de Morretes; verdadeiras peças de museu que guarda com empenho e zelo. 
     Portanto, caro leitor, não se engane ao ver um rapaz magro e sorridente roçando o Oleoduto da Petrobrás lá pelos lados do Anhaia - mesmo que o boné que ele tanto gosta e provavelmente esteja usando seja de uma de suas subsidiárias - ele não tem nada a ver com a Estatal...
     Ao pedir alguma informação sobre a região ou "ganhar" uns minutinhos de conversa com ele você logo perceberá...
     Ele é apenas um cidadão brasileiro fazendo um pouquinho a mais do que olhar para seu próprio umbigo. Embora nem sempre tenha o prestígio que merece.
Dona Josefa, a matriarca dos Pereira e Edemilson.

"O menino olhou o rio
E o rio deixou-se refletir.
Refletindo, o menino, 
sabia que, assim como o rio 
muito longe poderia ir"
Papael Kozechen 06/06/2018


Rio dos Padres

Edemilson Pereira realizando melhorias e adequações no Sitio Vanessa - implementação e readequação de  sistema de saneamento eficiente.

Créditos fotos: Papael Kozechen e Juliano Rocha

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Abrolhos - VIA BANDEIRANTES- A última grande batalha ou NADA DO QUE FOI SERÁ DE NOVO DO JEITO QUE JÁ FOI UM DIA!

   -- “Lasciate ogne speranza voi ch’intrate” (Ao entrardes aqui, abandonai vós toda a esperança!) Trecho do Canto III – Inferno, A Divina Comédia – Dante Alighieri --



 "Os braços já estavam em frangalhos, a respiração ofegante, o instinto em alerta. Um pouco de força, sabiam que ali era o ponto crítico. Cair ali seria despencar centenas de metros abaixo, passando em apenas alguns segundos num voo livre pela famosa Fenda Principal."


     Há muito que Roberto e Papael estavam se “ensaiando” para essa aventura. Seria a cereja do bolo, o “gran finale” e, por consequência, uma das mais difíceis peripécias que a dupla tinha colocado como sonho a ser executado no Marumbi. A outra foi quando executaram os 9 cumes do Marumbi em apenas 16 horas. A referência acima do texto do início do século XIV era o que sabiam da Bandeirantes – Se entrassem na via não poderiam mais voltar – a saída seria apenas para cima, apenas pelo cume.
     Roberto contava já com seus quase 64 anos de idade, Papael com seus quase 95 kg. Ambos gozando de uma saúde invejável.
Rafael Kozechen (mais conhecido como Papael) conheceu o Marumbi em 2010, Roberto M. Carneiro (mais conhecido como Robertinho) começou a frequentar assiduamente a Montanha Azul 43 anos antes. Em 1973 Robertinho já tinha colecionado várias subidas, inclusive algumas na Via Bandeirantes, no Abrolhos. 
     Essa via, atualmente está configurada assim - Via Bandeirantes 150m IV M1.


     Roberto comentava que a via antigamente só tinha dois lances difíceis: um já na saída para alcançar um grampo seco e outro chamado “cavalinho”. O resto era uma subida vertical porém protegida, ora por galhos e raízes ora por grandes platôs. Portanto, era comum levar pessoas “inexperientes” para o primeiro contato com paredes. Porém, anos depois um desmoronamento reconfigurou a trilha, transformando-a em uma via bem exposta. 
Bandeirantes - Setembro de 1973
     Para torna-la “usável”, os montanhistas colocaram algumas cordas fixas para auxiliar a subida nas áreas mais expostas e, em geral, com bases em platôs de matos e taquaras que não passam dos 50x50 cm, já quase caindo por ação das intempéries climáticas que ocorrem por lá e pela fragilidade da mata. Ou seja, estava bem diferente daquela frequentada por Robertinho nas décadas de 70 e 80.
     Já Papael, conheceu a trilha que leva ao Parque do Lineu em 2013, junto com Camila Armas, Rodox (Rodolfo E. Nickili Neto) e Cover (Giancarlo Castanharo) que naquela oportunidade iriam escalar a Via Maria Buana. Ali, Papael pode olhar com mais clareza o que lhe esperava e pode estudar um pouco melhor as paredes. Subiu dois pequenos patamares em direção ao grampo, sendo chamado a atenção por Camila com um suave “Papael, desce dai!!!”, sinal de amizade, cuidado e segurança. Atendeu prontamente ao pedido.
     Depois disso, Papael começou a estudar a via, tirou cópias de passagens em livros que falavam sobre a Via Bandeirantes, analisou fotos antigas e pediu várias informações e croquis. Conseguiu alguns descritivos preciosos com “Tavinho” (Gustavo Castanharo) e boas dicas com Bruno Lespinasse, Cover, “Segundas” (Fabio Szezesniak) e “Chiquinho” (José Luiz Hartmann). Estava pronta a festa.
     Após, várias visitas com chuva ao Marumbi, Roberto e Papael rumam novamente ao Parque Estadual; em uma manhã chuvosa de sábado, no dia 25/07/2015. Após uma hora, o tempo abre como um milagre. Era um sinal. Na manhã seguinte, recebem a visita de Dom Carlos de Cascavel e após uns minutos de conversa a dupla ruma às 9:15hs em direção ao Parque do Lineu. No caminho encontram um grupo que lhes havia dito que iriam tentar fazer o conjunto. A dupla aconselha o grupo em abortar, pois eles estavam em hora avançada, lentos e com alguns integrantes debilitados. Sugerem que sigam apenas para o Abrolhos.
     Minutos depois são alcançados por Segundas, Bruno e Chiquinho, que rumam também ao Parque com previsão de dois pernoites para uma futura abertura e conquista de via. – Na semana seguinte, são informados que Chiquinho retornara ao Parque do Lineu para continuar sua empreitada e  levara uma queda, onde acabou se machucando, tendo que ser resgatado por helicóptero-
     Chegam no rio perene da entrada do Parque no Lineu e ali são interceptados por Leandro Pacheco e Liamar Pereira (CPM) que também vão para a Bandeirantes.
     Na base da via Enferrujados, todos se reúnem para um lanche, hidratação e descontração. Robertinho e Papael seguem em direção a trilha. Papael guia esse começo de trilha e os leva até a base da canaleta em diedro que dá acesso à um grande grampo antigo subindo três patamares à esquerda na base da via Maria Buana e da Fenda Principal. Nesse ponto, Roberto passa a guiar e sobe em livre, sendo calçado por Papael que segura seus pés na rocha para que ele não escorregue. Depois da metade da parede ganha, Roberto sobe solo, com esforço e muita coragem para alcançar o grampo e não descer os 15 metros abaixo, levando em suas mãos a corda que fará a segurança para Papael. Roberto passou a corda pelo olhete e Papael, juntamente com um pouco de técnica de escalada faz uma espécie de “auto-reboque”, lembra-se do conselho do Segundas: "Só não pode cair, senão...". Mais alguns movimentos para cima.  A primeira parte estava superada.
Auto-reboque


     A partir dali, galgaram metros à esquerda e subiram, erroneamente, cerca de 5 metros por um lance de pedra, provavelmente algo como um grau V. Viram uma canaleta à esquerda, provavelmente o caminho a ser seguido, porém resolveram esperar a dupla Lia e Leandro que vinham logo atrás ao ver que poucos metros à direita estavam as chapeletas da Via Maria Buana.
     Leandro, chegando à dupla, exclamou que nunca tinha visto ninguém daquele ângulo e, seguindo à frente, levemente à esquerda, achou o caminho correto. Papael e Roberto tinham feito um lance difícil sem proteção; numa espécie de “não sabia que era impossível, foi lá e fez”. Leandro brinca, que seria engraçado se algum escalador super equipado passasse logo ao lado da dupla com cara de espanto, como se estivesse vendo aquelas cabras montesas em alguma parede.
     Na posição que estavam não poderiam retornar para a base onde erraram, certamente cairiam no precipício.  Após alguns minutos pensando, passaram uma canaleta num salto, agarrando as frágeis moitas de taquarinhas.
     Passado o susto seguiram adiante, Papael na frente, elevando-se montanha acima, se agarrando em pequenas árvores torcidas ou em algumas cordas que apareceram depois do desmoronamento. Após mais alguns lances, chegam em uma canaleta com diedro. No alto dele a canaleta continua estreita na horizontal, com uma pedra grande encaixada no topo da parede, logo acima mais um paredão em negativo, formando um teto muito estreito: Chegaram ao Cavalinho. Roberto vai na frente, agarra-se na frágil vegetação até atingir o ápice do lance; de lá, vira o corpo para a direita e encaixa sua perna esquerda na canaleta estreita, encaixando junto com o quadril, também o torso na pedra. Pronto, estava montado no Cavalinho. Dali foi passando os singelos metros à frente, raspado levemente as costas no teto da parede. Mais um pouco e alcança o platô com um árvore segura. É a vez de Papael que repete os movimentos. Porém, ao chegar no ápice, quebra uma árvore seca causando um grande barulho. Papael estava muito bem apoiado, mas Roberto, que estava de costas, leva um susto trazendo “o coração para a boca”, pensara que seu companheiro tinha despencado. Passado o abalo emocional causado pelo inesperado, Papael, por ter o corpo maior, na metade do lance é obrigado a segurar a pedra e deslocar o corpo para fora da parede, segurando-se apenas com as mãos e fazendo pressão com as botas contra a parede, pois entalaria facilmente se seguisse os mesmo movimentos de Robertinho. Papael, antes de executar os movimentos, lança a mochila, a corda e o chapéu, pedindo para seu companheiro laçar a árvore com a corda e amarra-se. Ato simplesmente para uma segurança psicológica. Se caísse, cairia igual à um coco na parede. Mas não despencaria no precipício. Minutos depois, estava a dupla junta, segura, esperando os outros dois companheiros que vinham atrás e estavam melhor “preparados” com equipamentos. Apertaram as mãos!
Papael observa Liamar passar no Cavalinho, Leandro camuflado dá segurança.
     A dupla, a partir dali, já sabiam que já estavam com a escalada no bolso. Seguiram por mais alguns metros por paredes e platôs, até chegar no último lance de corda fixa. Um platô bem instável, quase caindo. Os braços já estavam em frangalhos, a respiração ofegante, o instinto em alerta. Um pouco de força, sabiam que ali era o ponto crítico. Cair ali seria despencar centenas de metros abaixo, passando em apenas alguns segundos num voo livre pela famosa Fenda Principal. Ali, depois da corda, Papael diz a Roberto: “Posso estar enganado, mas acredito que não. Robertinho, eu já estive aqui!
Mais alguns metros e olhos curiosos de aventureiros já no cume do Abrolhos veem surgir do abismo à sua frente duas figuras pitorescas nas paredes, eram Roberto e Papael. Olham a dupla com rostos intrigados e perguntam de onde vieram.
     Os companheiros respondem orgulhosos: Viemos pela Bandeirantes, pela parede. Aquele paredão “laranja” que vocês viram lá de baixo – Explicação mais simples para que os incautos visitantes entendessem melhor- São saudados efusivamente. Alguns, pedem para registrar o momento, pedindo para tirarem fotos com Roberto, símbolo de disposição, jovialidade e experiência. Papael e Robertinho cumprem um bom e velho ritual que mantém: Apertam as mãos. Mas desta vez, agregam um abraço! Roberto pede uma foto com Papael para "eternizar" o feito. Tinham acabado de conquistar o Abrolhos – montanha essa que, vista dos Desfiladeiro das Lágrimas, se assemelha à uma figura monstruosa, vigiando furtivamente, espreitando suas vítimas na Estação Marumbi. Tinham acabado de dominar o monstro colossal e colocados prostrados aos seus pés todos os objetivos que tiveram para aquele conjunto. Era o fim. Saíram vitoriosos.  Logo são alcançados por Lia e Leandro Pacheco. Os quatro cumprimentam-se!
Foto no Cume do Abrolhos após Via Bandeirantes.


     Papael e Roberto, após a assinatura no livro de cume, onde contaram sua aventura, abraçaram-se para uma última foto. Breve descanso e partem para a descida da montanha, pelo caminho usual.
Assinatura do Livro de Cume


     Foram cinco tentativas anteriores que não deram certo, foram frustradas ora por condições climáticas, ora por condições físicas e psicológicas. Esta seria a última tentativa. Superado finalmente. Vendo as imagens agora, um turbilhão de lembranças percorreram a mente de Roberto. Lá, ele estava bem tenso, não havia tempo para reminiscências. Ficaram algumas penas aqui e outras ali no caminho. Segundo Roberto, eram dos nossos anjos da guarda. Poucas foram as fotos pois não sobravam mãos para segurar máquinas e/ou celulares.

Cumpriram a meta, chegando à Mansão 4 Bicos, na Vila do Marumby às 16:10hs, orgulhosos! Comemoram! E não pensam mais em nada!
Linha aproximada da Via Bandeirantes


Assinatura no Livro de Presença da Mansão 4 Bicos

terça-feira, 28 de abril de 2015

Bom dia, Vietnã!!! - Quando os soldados são forjados na Serra -


" Foi quando se manifestou do nada o lado brilhante e instintivo que alguns montanhistas têm. Lembro até hoje: Tínhamos pouca visibilidade, o GPS não dava o sentido correto da trilha, andando em gangorra com as mochilas cada vez mais pesadas e não encontrávamos a trilha certa. Então segue  um minuto de silêncio. O Papael, praticamente possuído, vira para a sua esquerda, pronuncia um estrondoso "Chega!!!",  abre 3 metros de quiçaça e cai exatamente na trilha, em frente à fita que claramente indicava que ali era a crista do Caratuva. Algo que considerei praticamente sobrenatural dada a altura que já havíamos percorrido desorientados pelos rios."    

 Esse texto foi escrito por Fabio Sieg, um dos idealizadores da Travessia Triangular Menor do Ibitiraquire. Realizada em Abril de 2014

     Qual ideia deve ser o centro de um relato acerca de uma travessia pela imponente e desafiadora Serra do Ibitiraquire? Possivelmente essa ideia central seja o sentimento.
     Desafiando 15 cumes, 4 amigos, que se conheciam poucos meses antes, em 4 dias, ensinavam lições à própria fé, fazendo por si, cada um, o esforço máximo não só para o sucesso, mas para a felicidade e união de um grupo.
Esse relato é parte de como nasciam, naquela época, um grupo montanhístico chamado "Os Loucos do Ibitiraquire".
     O primeiro sentimento que temos nessa experiência é o do contato com o novo. Lembro que conversamos pouco pela internet, tão logo surgiu a ideia de fazer a loucura de sair da Fazenda Pico Paraná, cruzar todas as montanhas da serra e bater uma espécie de “31 meu” nas placas do Ciririca. E tínhamos, para isso, o feriado de Páscoa e uma grande vontade de fazer a proeza acontecer.
     Poucos relatos, principalmente dos montanhistas mais experientes da serra, mostram os bastidores das trips quando se configuram por meio da internet entre desconhecidos. Era o nosso caso...
    O Papael Kozechen era o cara são da turma (por ai dá para ter uma noção de que a coisa não estava boa), sua grande experiência permitia que o mesmo nos chamasse de loucos e insanos quando íamos propondo absurdos de tamanha pretensão em tão pouco tempo. De tão pessimista, digo: “realista”, chegou (em suas próprias palavras) a ser meio chato, mas se redimiu mostrando ser um grande líder e um amigo muito especial na hora de materializarmos o nosso combate daqueles dias de Abril, majorando o respeito que adquiriu, ao longo dos anos, como montanhista.
     O Adilson Cypriano era o idealizador da parada. Eu lembro que já naquela época ele era o mito do facebook, era o cara que vinha lá de São Paulo agitar as Trips aqui no Paraná. Eu o conhecia por uma dessas investidas no Marumbi. É uma cara que para sempre vou considerar muito, seja pelo amor, respeito e admiração que tem pelas montanhas ou então pela habilidade que adquiriu para permitir que a esposa lhe libere para isso (ele mesmo sempre fala disso, rsrs)
     Gabriel Good Neto só dava risada, apesar da anarquia, sempre foi a parte otimista do grupo: o piá novo, resumindo e estampando por fora tudo aquilo que todos ali eram por dentro. Fazia as coisas ficarem leves por meio do seu grande carisma, que misturado com sua pouca idade (comparados aos velhos aqui), fizeram dele o mais atazanado em todo o caminho.
     Existem outros nomes. Alguns dos que estão entre os "Loucos" ajudaram durante a logística, pois os perrengues da vida não possibilitaram as suas participações efetivas. Cito o grande André, cara guerreiro que poupou seu joelho lesionado por recomendação médica e o Kelvin, que iria apanhar em casa se embarcasse nessa. (Brincadeira, o Kelvin foi um grande parceiro e um dos idealizadores da aventura, mas tinha compromissos inadiáveis naquela Páscoa e deixou claro desde o começo, sendo sua atitude de colaborar, mesmo não podendo ir junto, muito louvável).
     Bem, eu sou o Fábio Sieg e sei lá o que eu fazia ali, só sei que eu tinha uma fé inabalável que iriamos conseguir, fora isso eu tinha umas garrafas de 5 litros de água, um gênio meio porra louca, papel e caneta na mão.
     O primeiro contato que tive com o Papael foi no Clube Paranaense de Montanhismo.
     Ahhh!!! Bem legal, um louco que subiu a Cadeia de montanhas do Cerro El Plata, na Argentina, com apenas 20 reais e ia dar uma palestra sobre o direito de ir e vir.
     Cara, o surreal começava ali, estava numa espécie de templo de loucos por aventura e o cara que foi declarado o sumo pontífice da montanha, em pessoa, era quem proferia a missa. Era um louco e ganhou imediatamente respeito e consideração suficiente para irmos ao boteco planejar toda a parada.
Naquele dia também conheci o Good: diretamente de Mafra/SC para o mundo, Gabriel Good veio de lá para assistir a palestra do Papael. Cara de adulto sério, se tornou lenda dos comentários virtuais e bastante comentado no dia pelos outros CPMs. Gente boa demais, apesar da cara de bandido homoafetivo.
     Éramos nós três num bar, o Kaes, no bairro Cabral em Curitiba e mais duas moças, a Andressa Zanlorenzi e a Lia Pereira, que saíram do Clube conosco e já tinham andando por diversos lugares e escalado um monte de coisa, ou seja, tínhamos muito assunto. Estávamos os 5 lá, papeando.
     E por falar em papear, eis que o Papael abre uma carta topográfica na mesa e deixa de ser pessimista e entra na onda. Fala daqui, fala de lá, mostra uma trilha daqui, uma trilha de lá e pronto. Já tínhamos uma prévia de que estávamos sendo meio retardados de tentar fazer a trip apenas com aquele pouco tempo e um par de pernas. Teríamos que ter logística para não morrer e nos tornarmos um exemplo do que não deve ser feito.
     Um dos grandes pontos positivos daquela conversa foi que, a partir dela, orientamos melhor as coisas e estávamos com os pés mais no chão. Acabando assim com o "fuzuê" que estava virando os planos no Facebook. Planejamos necessidades: enterrar comida e água nos caminhos, pois o peso seria um dos grandes rivais da empreitada.
     Foram dois pontos alvos de nossos planos. Enterrar comida no Cerro Verde, e assim fitarmos o caminho até lá, que na época era bastante complicado, pois umas chuvas reconfiguraram a vegetação meses antes. O mesmo precisava ser feito no Itapiroca. Dessa forma, enterrando água e comida, teríamos que carregar, por baixo, uns 20 quilos a menos durante o trajeto.
     Os primeiros ataques foram feitos pelo Papael e eu. Num dia relativamente bonito fitamos umas correções no Itapiroca, pois até ele estava meio alterado em função de algumas quedas de árvores, e nos direcionamos ao Cerro Verde. Lembro que na época ganhamos muita confiança, pois era um trajeto que havíamos planejado fazer para dormir, levando, inclusive, barraca e fogareiro, mas não foi necessário. Era praticamente uma hora da tarde e a missão já estava completa.
     Naquele dia encontramos, por coincidência, o Alexandre Pizollato, um dos Loucos desde aquelas épocas. Ele voltava com a namorada, nos disse que o caminho estava muito tortuoso. Tentou atacar o Ciririca por cima e falhou onde, inclusive, temíamos a nossa falha. Na época descobrimos uma trilha secundária que enganava o povo ali e fitamos imediatamente a entrada correta para o caminho ao Cerro Verde, quem sabe a grande sacada do dia.
     Deste dia veio a grande primeira lição. “Esforço”, esse é o amuleto da sorte. Fazer aquele trabalho antecipado nos permitiu ter uma visão ampla e uma aproximação com a totalidade do que enfrentaríamos. Mais à frente, já nos dias de travessia, foi decisivo e determinou o sucesso da Trip.
Voltamos, já escurecendo, pela Fazenda da  Bolinha, onde pedi resgate para uns colegas.
     Retornando muito confiantes e já sabendo que conseguiríamos, foi um dia de ótimas lembranças e de muitas risadas, grandes histórias de aventura e de piadas fracas do grande amigo Papal.
     O segundo ataque fiz sozinho. Uma noite chuvosa daquelas em que é melhor enfrentar a natureza do que algumas saudades. Por coincidência, dessas muitas, encontrei o André, acampado com sua Azteq Nepal lá na Fazenda Pico Paraná. Quando soube que eu ia para o Itapiroca ficou meio assustado em função da previsão de chuva. Mas recomendações, boa sorte, e fui! No caminho, tão logo passei a bica, a chuva não permitia mais andar em meio aos galhos e a temperatura começou a baixar abruptamente, decidi abandonar a carga, escondida no caminho, e descer até a casa base. Era hora de ser prudente. Lá, dormi e tão logo o dia nasceu encarei a missão que já no dia anterior eu havia iniciado.
     Com a luz do sol e menos chuva, subi nossa carga e enterrei uns 7 quilos de comida e um galão com 5 litros de água, um ao lado do outro, em meio ao bosque que segue entre o cume falso e o verdadeiro do Itapiroca, sentido Cerro Verde.
     Encontrei o dono de uma marca de roupas fazendo making fotográfico, apesar do dia meio feio. Conversamos muito e ele achou bacana a ideia da Trip. Descemos com um outro colega até o cruzo. Não aguentei, subi o PP para dar aquela energizada e desci chegando bem tarde em casa e cansado pacas. Dormi como em nenhum dia daquela semana.
Umas semanas depois fomos novamente eu e o Papa fitar do Caratuva até o Taipa, um trecho que estava bem pior do que aquele fitado no mês anterior. Com tempo excelente não tivemos dificuldades além do sol forte.
     Isso mostra que a Trip começou muito antes dos dias de caminhada oficiais. Fomos dignos já pelo esforço que antecedeu, usando ao máximo o senso lógico e prevendo situações que poderiam surgir. Mas nada na vida é perfeito, algumas falhas ocorreram e muito aprendemos com elas.
Chegou o feriado de Páscoa. Combinei com o Good Neto para ele pousar lá em casa. Ele mora em Mafra e eu não deixaria um amigo desse pagar hotel desnecessariamente. Avisei minha família da situação e todos dormiram armados até os dentes, esperando pelo pior, que não aconteceu. Brincadeira. Fizemos os últimos ajustes no GPS, nas mochilas e fomos dormir meio tarde para no dia seguinte partir.
     Pegamos o Papael no caminho, que logo já começou a contar piadas, se abriu todo ao ver o Good e deu espaço para que a zueira não tivesse mais fim. O Adilson estava um pouco a frente, no posto próximo à Fazenda da Bolinha. Era tanta chuva que antecedeu aquele começo de outono, lá por meados de Janeiro, que a estrada até essa fazenda havia sofrido erosão completa em um trecho e os carros não passavam mais, a partir de uma parte dela.
A icônica
     Ali deixamos o automóvel dele e fomos com o que eu dirigia, já arrumadas as mochilas, até a Fazenda Pico Paraná onde oficialmente a aventura começaria e arrumaríamos as mochilas mais uma vez como uma noiva faz com seu vestido na véspera do casamento.
     Uma neblina dava a cara de Abril para o dia e apostamos nas boas previsões do tempo para aos próximos dias, que na verdade nem eram boas. Subimos o Getúlio batendo papo, tirando foto e por ironia comentávamos que o primeiro dia seria o mais fácil. Os planos eram subir o Caratuva, deixar a carga, atacar o Taipabuçu e retornar até o A1 em direção ao Pico Paraná. O tempo começou a firmar e isso incentivou muito o grupo.
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     Após atacarmos relativamente bem o Taipabuçu, subimos novamente ao Caratuva e percebemos que seria, em função do tempo, inviável chegar ao A1 com aquelas mochilas. Decidimos entrar mata à dentro utilizando a inóspita trilha da conquista para acelerar os passos e possibilitar a manutenção dos planos.
     Então, o dia que era para ser o mais fácil tornou-se o mais difícil.
     Nos perdemos, durante cerca de uma hora, sendo desorientados pela névoa, a falta de luz e  por dois rios que se formam logo no vale que segue ao A1. O GPS não colaborava, a neblina ficou extremamente densa e a temperatura baixou drasticamente. O psicológico pesou e: Meu Deus!!! Era o primeiro dia!
     Foi quando se manifestou do nada o lado brilhante e instintivo que alguns montanhistas têm. Lembro até hoje, tínhamos pouca visibilidade, o GPS não dava o sentido correto da trilha, andando em gangorra com as mochilas cada vez mais pesadas e não encontrávamos a trilha certa. Então segue  um minuto de silêncio...
     O Papael, praticamente possuído vira para a sua esquerda, pronuncia um estrondoso "Chega!!!",  abre 3 metros de quiçaça e cai exatamente na trilha, em frente à fita que claramente indicava que ali era a crista do Caratuva. Algo que considerei praticamente sobrenatural dada a altura que já havíamos percorrido desorientados pelos rios.
     Descemos como um raio por ela, extremamente fechada tornou-se lúcida ao sairmos do bosque e ficarmos na região tapeteada por caratuvas, por onde a trilha se desenha até a entrada do A1.
     Mas não pense que a pernada foi pouca. Acampamos já era tarde. A “perdida” havia desmotivado psicologicamente o grupo. Lembro que a janta foi o que nos motivou e ao dormir o céu deu sua deixa, transpondo suas nuvens e abrindo-nos as estrelas em uma lua minguante daquelas que não se esquece. A serenidade do Adilson foi importante naquele dia, mostrou estar muito mais centrado e calmo ante o desacerto que tínhamos enfrentado. A noite estava quente e bivaquei na porta da barraca, foi uma noite excelente para um dia que havia nos torturado.
Comida de Astronauta. Feliz dia de Cosme e Damião!
     O segundo dia foi decisivo - Tivemos a lucidez de que deveríamos ser rápidos ou não teríamos como terminar - nossas diferenças não eram mais úteis. O Papael assumiu o comando da caminhada e democraticamente decidíamos juntos os caminhos.
     Praticamente correndo, assustando os turistas do feriado, fomos em direção ao PP logo cedo. Chegamos rápido e tivemos nosso momento de prece e zombaria. Dançando Moon Walk no Cume enquanto o sol secava a roupa que a neblina da noite havia detonado. O desgaste já era um vilão. Para rimar com vilão descemos o União, sentido Ibitirati.
Moon Walk no PP
     Abismos lindos nos seguiam e em pouco mais de uma hora estávamos no cume sagrado do irmão pouco frequentado do Pico Paraná. Em minha opinião o melhor momento que tivemos em toda a Trip, um pedaço de manhã no Ibitirati.
O Segredo das paredes do Ibitiraquire Broken Montain
     Descemos como aquela criança que guarda seus brinquedos e retornamos para o A1. Dando aquela olhadinha para o Morro dos Camelos, que estavam nos planos, mas não tinham espaço apenas em 4 dias.
Discoporto
     Chegamos relativamente cedo ao A1, onde nos calçamos das pesadas mochilas e partimos ao local do nosso segundo acampamento e nosso sexto cume, o majestoso planalto do Ibitiraquire: Itapiroca. Dormimos no que se consistiu em uma noite fechada pela neblina, no entanto gentil com relação à temperatura. Então um dos destaques daquela trip fez diferença: tínhamos muita comida enterrada!
Um fato que mostrou muito que Deus estava ao nosso lado foi que, quase no cume, alguns poucos metros mesmo, vimos um rapaz com um galão de 5 litros na mão. Perguntamos como quem não quer nada se ele tinha água sobrando para nos doar. Ele gentilmente nos ofereceu o galão cheio e inteiro. A ironia foi que ele falou com uma veracidade tão inquestionável, que nos fez acreditar que aquele galão tinha sido levado por ele lá para cima.
Sexto Cume : Itapiroca

     Quando fomos desenterrar a comida, pra nossa surpresa: haviam encontrado nossa água (sim, era o galão do cara: safadheeenho!), mas não haviam descoberto, ao lado, por muita sorte, nossa comida, pois a urna em que ela estava era preta e se confundiu com o solo. Huuuu... Mais sorte que juízo.
     Comemos como reis naquela noite. Tínhamos muito mais comida do que era necessário e foi exatamente isso que nos deu capacidade de prosseguir muito mais recuperados do que era previsto.
Não lembro quando foi, mas nesse intervalo até o Itapiroca decidimos que não seria possível fazer o caminho até o Ciririca por cima, pois estaríamos muito mais pesados quando pegássemos a comida enterrada no Cerro Verde. Mas nosso combinado era que chegássemos no Ciririca. Só assim a travessia teria o sentido inicial.
     Quando estávamos indo ao Cerro Verde - o Papael escrevendo sempre nas caixas de cume com seu tradicional folheto/adesivo do panda - decidimos batizar a Trip, e por coincidência, naquele momento eu pensava que nosso rastro pelo Ibitiraquire era em formato de um triangulo. Sugeri de imediato: Travessia Triangular do Ibitiraquire e unanimemente todos gostaram. Um pouco a frente, quando vimos que as pontas do triângulo seriam o Ferraria, o Ibitirati e o Agudos, decidimos adjetivar o nome dela para não confundir as coisas: Travessia Triangular Menor do Ibitiraquire. Dessa forma, o próprio batismo da primeira já nos desafiava para a próxima: A Travessia Triangular Maior.
     O tempo melhorou um pouco na tarde que pegamos a comida no Cerro Verde. Atacamos na sequência o Tucum, como parte da rota que desviaria o caminho por baixo. Levamos uma perdida ali que nos fez entender definitivamente que entrar mata à dentro por cima era uma péssima escolha e que havíamos acertado na escolha de ir por baixo. Ele foi nosso oitavo cume, e ali as variações de altimetria, somada ao cansaço dos dias, começou a pegar.
Acampamos no Camapuã, o que de brinde nos trazia o cume do Camacuã que foi visitado mais tarde. Assim sendo, já tínhamos 10 cumes até então. 13° ascensão.
Ceia de Pascoa no Camapuã
     A noite de acampamento foi a mais tensa de todas. Fomos surpreendidos por uma chuva que lembraremos por muito tempo. Dessa vez, sem gentilezas, a natureza nos agraciou com um frio que descontrolava o tremor do queixo. Cozinhar foi uma tarefa tensa e salvadora naquele momento.
O mestre cuca do sopão era o Papael, eu ficava com a atribuição de segurar o fogareiro dentro da barraca com a responsabilidade de evitar um incêndio. Foi praticamente uma cirurgia aquele prato de sopa. Ai veio o segundo problema, levar a sopa para a outra barraca, no meio da tempestade, que não daria trégua durante toda a madrugada.
     Não lembro agora se foi o Papa ou eu que acabou levando a "delicia delivery", mas eu lembro que no meio da noite a barraca dos caras estava sofrendo por conta do vento e uma lona mantida sobre ela evitava que o vento a levasse, e aqui não exagero em nada, por aí vocês já podem ter uma ideia da seriedade da situação.
     Eu tive um momento de “coragem”, sai da barraca com a roupa molhada e em um frio antártico cantando Raul Seixas enquanto tentava arrumar a lona para eles, o vento era tão forte que dava socos na lona e me puxavam junto, no auge dos meus 120 quilos de músculos definidos e torneados. Com cordas e o que era possível, travei a barraca deles contra o vento e os colegas sobreviveram, foi essa atitude de companheirismo, pela qual, em consonante opinião, salvou-se uma noite catastrófica, para apenas uma noite caótica. Mais tarde o mesmo companheirismo me foi retribuído em dobro.
     Até então, nossa maior preocupação parecia ser arrumar novas formas para zoar o Good Neto que, injuriado, começava a dar sinais de mau humor. Então, de tanto zoarmos o mau humor dele, ele desistiu do mesmo e começou com o tradicional e lazarento: Bom dia, Vietnã!!!!! Acordando até os urubus do Ibitiraquire.
Favela no Camapuã
     Por dentro a coisa era mais tensa. Sabíamos que adentraríamos rumo ao Ciririca com o trágico daquelas árvores que haviam caído em Janeiro e levado grande parte da trilha junto. Estávamos cansados e lacerados pelo esforço das ascensões ininterruptas. Porém, era hora de focar e partir.          Sabendo que seriamos tentados ao passar pelo cruzo que nos levaria novamente ao conforto de nossas casas mais rapidamente em um dia fechado.
     Nessa hora tivemos certeza de que éramos guerreiros de verdade e que nosso forte era a determinação. Demos as costas para aquele cruzo de perdedores, escondemos as cargueiras no mato e fomos, de ataque, e dando as costas para a vida social que podia ser escolhida naquele instante. Subimos com o vigor que ninguém compreende, mas dá sentido ao montanhismo. Éramos nós contra o Ciririca, já no 4° dia de subida, caminhada exaustiva, cansaço extremo e as piadas do Papael.
     As minhas dores já não eram suportáveis e creio que a partir da metade do trajeto o joelho parecia estar sendo perfurado por brasa, mas o corpo quente mantinha a cadência dos passo.
     Próximo à corda, marca do Ciririca, encontramos o "Power Ranger Branco" da trip, aquele personagem que aparece  do nada quanto a coisa  está realmente complicada: Eis que aparece nosso amigo Anderson EP. Estava simplesmente atacando o Ciririca na boa, após ter chovido e com o dia parcialmente nublado. Ai víamos que a montanha nos respeitava e abria os portões de seu castelo.
     Ele seguiu até o cume do Ciririca com nós 4.
Equipe inteira reunida
   
Porque fumaça pouco é piada
     Cansados e inacreditavelmente felizes por dentro, nos encantávamos com a paisagem da brava e respeitada montanha. Não importava a neblina, não importava nada. Livro de Cume assinado, registro feito. O K2 da Serra do Ibitiraquire era nosso!
Mas faltava sobreviver.
Inaugurando a Travessia Triangular Menor do Ibitiraquire
     Após o corpo esfriar, por ficarmos parados no cume, a dor rompeu o limite do tolerável. Desci como se o joelho fosse um inimigo ingrato por ter sido maltratado no caminho.
     Com ajuda dos companheiros e com os olhos lacrimejados de dor, do tipo que não é viadagem, chegávamos cada vez mais perto da fazenda que findaria a conquista da Travessia Triangular Menor. Começada meses antes e que tanto orgulho nos trazia, ia embora e permitia que voltássemos para nossas casas - pois nosso lar é a montanha - usufruir do controverso conforto que o trabalho social construiu ao longo da história.
Coelhinhos da Páscoa
     Onze cumes de respeito, quinze ascensões e o Sucesso era o combustível, enquanto a trilha de volta parecia nunca acabar.
     Anoitece e o uso das lanternas redobra a sapiência da exaustão e do interminável caminhar. Muitas horas de caminhada, quatro dias completos, quando farejamos o gramado da Fazenda da Bolinha - o latir dos cães vira música. O sorriso e o contentamento tomam conta do grupo.
     Abraçamos a felicidade e comemoramos como um grupo de soldados que voltava da guerra. Poucas forças, dois “sentimentos” contraditórios: A intensidade que apenas a alma sente da conquista e a tristeza da despedida dessa aventura que pretendo nunca mais esquecer.
     Anderson se despede do grupo, volta para o  seu "Megazord" e vai embora. Os outros Rangers seguem em direção à Fazenda Pico Paraná para resgatar o outro automóvel.
     No posto Tio Doca brindamos o feito. Tomamos banho por lá, e água quente tão valorosa não existe. O Adilson segue em direção à São Paulo, nós para Curitiba. E todos distantes estavam juntos em sentimento.
     Ali, verdadeiramente nasciam os Loucos do Ibitiraquire, que até então eram só um grupo no Facebook. Desconhecidos que a modernidade uniu, que até hoje se orgulham do feito a ponto de querer repetir inesgotáveis vezes a façanha, até que esse triângulo que atravessa a serra aumente, ou esse polígono de verdadeiros amigos cresça cada vez mais...

Texto: Fabio Sieg - Loucos do Ibitiraquire
Vem comigo, Tô vendo o caminho...

Altimetria

Marco da Alfa Crucis no vale do Caratuva

Trakinas

Adilson no Cume Verdadeiro do K-2 Paranaense

Vagalume do Ibitiraquire

Éramos 5!
Fênix em flexão - Ressurgindo das cinzas


sexta-feira, 24 de abril de 2015

“Projeto MARUMBI Completíssimo em 1 dia”

"Eternamente molhado, é um ótimo local para despencar em caso de poucos cuidados. Logo a frente, embora não tenham contato visual, sabem que seu próximo destino está logo à frente, tal qual um monstro contorcido, pronto para engolir qualquer um que ouse desafiá-lo."

-- O Pré- Projeto – (O início de tudo!)

          Em 1973, tendo em vista a dissolução de dois grupos antagônicos, os Bebuns e Mamuca (Marumbi, Mulher e Cachaça), alguns servindo o exército, outros casando, estudando, dando, ou coisa que o valha, sobraram eu da turma do MAMUCA e outro do Clube dos Bebuns. Para não morrer, montamos uma sociedade e comprando um terreno, construímos uma casa onde fomos felizes para sempre enquanto durou.
         Durante a semana fomos respeitáveis trabalhadores em Curitiba e nos sábados domingos, feriados, férias, o Marumbi era nossa praia. Passagem de ano com direito a guerra de foguetes contra nossos vizinhos, festas de São João com grande fogueira, semana de carnaval com proibição de falar no assunto, eleições para prefeito da República Livre do Marumby, que depois virou monarquia; e entre uma trepada e outra, também trepávamos nos morros, ou era ao contrário não lembro.
         Muita gente festando, pois como o poema, nas horas de riso a casa está cheia e tem gente apinhada, cascateando alegrias. Em uma semana levávamos a família, as namoradas; aquilo tudo era um santuário. Na semana seguinte era a da festa e das meninadas.
         Mas chegaram as paixões, os nenéns, as responsabilidades. Tudo virou família. E foi bom enquanto durou. Tive que pensar no futuro e arrumei um emprego decente que me impedia de encontrar os amigos, pois minhas folgas eram só durante a semana. Acabei deixando de ir, pois se os dias passados sozinho na serra são lindos, as noites são cheias de fantasmas, (risos). Os anos de zoeira acabaram. Vieram as caras-metades, os filhos, a idade. Do original restou a fachada.
         A casa está lá, e um dia voltei; não só, mas sim com amigos.  (Roberto M. Carneiro – O Robertinho)

-- O início de uma utopia—

        Em 27 de Junho de 2010, três montanhistas: Luiz Suzuki, Roberto Carneiro e Rafael Kozechen (Papael), resolveram ir ao Marumbi fazer o Conjunto (subir a trilha branca ao Olimpo (1539 m) e descer pela vermelha-noroeste-) com um diferencial, iriam realizar um desvio para o Abrolhos (1200 m). Para maiores informações vide vídeo (http://www.youtube.com/watch?v=OhF-1I_IHV8 )
       Em 06 de Novembro do mesmo ano, encaminharam-se novamente ao Marumbi para, dessa vez, fazer o caminho inverso e fazer um desvio para a Esfinge. Para maiores informações vide vídeo (http://www.youtube.com/watch?v=AGrkj3gshDU ).
       Na descida, entre uma parede e outra, olharam para os lados e perceberam que havia muita coisa para conhecer: Torre dos Sinos, Facãozinho e Boa Vista.
        Entre uma conversa e outra surgiu a ideia de fazer o Conjunto Marumbi Completíssimo, andando por todos os 9 cumes que compõem o conjunto em 2 dias, porém, como o acampamento nos cumes do Marumbi se faz proibido, ponderaram que deveriam fazer essa “pernada” em apenas 1 dia. Coisa pesada!
         O tempo foi passando e outros sonhos foram sendo conquistados, Janela da Conceição, travessia do Ciririca “por cima”, etc....; e os laços de amizade entre Robertinho e Papael foram se estreitando.
        Com Marumbi marcado, Roberto e Papael seguem no dia 03 de Março de 2012 para o local e, devido à chuva, abortam a subida que tinham marcado. Com uma breve estiada, seguem pelo Parque visitando Pedra Lascada, túnel do Rochedinho, Viaduto do Carvalho e Ponte São João, no retorno, sobem pelo túnel do Rochedo e atingem o cume do Rochedinho; do alto, marcam que a Completíssima deveria passar pela Pedra Lascada e Rochedinho pelo túnel, descendo pelo outro lado, encontrando com a frontal do Olimpo. Em conversas posteriores, abandonaram a ideia, pois 30 minutos poderia fazer falta ao final do projeto, pelo suposto avançado da hora. Portanto, subiriam e desceriam o Rochedinho (1º cume) pelo caminho normal, encontrando e seguindo pela frontal do Olimpo até o desvio do Facãozinho.
         Em 14 de Abril de 2012 a Torre dos Sinos era o objetivo, torre separada de todas as outras, quase uma ovelha negra, mitológica, mágica, difícil! Ao galgar a crista que dá acesso a esse outeiro, percebem que pouco se usa a trilha dessa montanha tão inóspita.  A dupla errou a entrada por apenas 5 metros, encontrando a picada minutos depois e logo passam pela mítica “Passagem da Torre”, que haviam lido em relatos e pesquisas, pois os mesmos não utilizam GPS (Global Position Satélite). Depois que atingiram o ápice rochoso pensam:  Agora falta pouco!
          Obstinados, semanas depois Roberto faz a troca para um veículo com tração 4x4, o que asseguraria a chegada a Estação Eng. Lange bem mais descansados do que se fossem a pé a partir de Prainhas.

- O Projeto –

          Enfim, após preparativos normais, na tarde de 04 de Maio de 2012, uma sexta-feira, a dupla parte para o Marumbi, mesmo com a previsão do tempo nada favorável. Enfrentam a péssima manutenção da Estrada de Prainhas, diante da infinidade de valetas, com tamanha profundidade, que por vezes pensavam que não conseguiriam chegar motorizados a Estação de Engenheiro Lange. Com esforço, alcançam o ponto final para veículos e seguem sem problemas, porem embaixo de chuva, a Estação Marumbi (485m).
          Acordam as 03:15 da manhã para o início da caminhada e após um café reforçado, mas com 15 minutos de atraso, as 04:15 saem em direção ao Rochedinho (625m). Avançam devagar devido a escuridão, num breu misturado com neblina que inspirava uma sensação assustadora. A passos certeiros, subiram ao primeiro cume da investida e cumprimentam-se com as mãos calcadas uma a outra, em sinal de amizade e confiança, ritual esse que se seguiriam pelo resto do dia a cada objetivo alcançado. Sem demora, retornam ao cruzo da Frontal, chegando nesse ponto as 5:00 hs.
          Realizam o desvio do Facãozinho minutos depois e, sempre subindo, encontrando-se com o alvorecer. Percebem, com o corpo já totalmente encharcado, as paredes gigantes da colossal montanha crescendo do lado esquerdo, e com as águas raivosas do rio Taquaral rugindo logo abaixo. As 07:00 da manhã se cumprimentam com mútuo aperto de mãos, selando a chegada ao segundo cume do dia: Facãozinho (1.100m). Fotografia apenas para registro, pois, como previsto, o céu estava totalmente nublado e a mata molhada.
         Descem a encosta e contentam-se ao cruzar o Vale dos Ovos em menos de 15 minutos e verem que se encontram na Picada do Pau do Maneco. Fazem breve descanso em um riacho, captando água para todo o restante do trajeto e preparam-se para a subida que antecede o cume do Boa Vista.

          Os montanhistas alcançam o campo de altitude e a relva dourada que se esparge pelo relevo abobadado a 1491 m. que marca o cimo do Boa Vista pontualmente as 09:05 hs e realizam a primeira grande parada para o café. Cumprimentam-se e descansam, 40 minutos depois, com os corpos tremendo de frio, saem em direção ao vale que leva ao bloco rochoso do Olimpo.
          Chegam sem problemas a Pedra da Lagartixa, porém, a partir daí o caminho segue um pouco mais dificultoso devido aos lances de rocha que se seguem e com a mata cerrada impedindo o avanço. Alguns minutos mais tarde, as 11:00 hs se veem no ponto sublime do maciço rochoso do Conjunto Marumbi (1539m.). Respirando um pouco mais aliviados, veem que ainda estão 45 minutos adiantados do que o plano inicial. Descansam com o olhar perdidos para os campos e outros píncaros que nesse dia se escondiam por entre as alvas brumas que insistiam em velar o andamento dos aventureiros; comem rapidamente e, após cumprimentos, fotos e registro no livro de cume, partem para o cume largo do Gigante (1487m). 


Passam sem problemas e seguem observando atentamente para não perderem a entrada da Torre dos Sinos. Perder a entrada de qualquer um dos objetivos seria perder preciosos minutos que fariam falta no derradeiro objetivo, que seria alcançado logo mais tarde.
          Entram à esquerda pelo Desvio da Torre e sem titubear, seguem pelo caminho pelo qual andaram 1 mês e meio antes. Logo alcançam a Passagem da Torre: Esta peculiar montanha está separada por todos os lados das demais. Entre a Torre e o Abrolhos se encontra o Desfiladeiro da Catedral e entre a Torre e o Gigante fica o Desfiladeiro dos Sinos. Uma passagem estreita, que não dá chance para vacilos; e do outro lado segue uma parede íngreme que também não deixa margem para titubeios. Minutos a frente e já estão a pouca distância do cume. Às 14:10hs cumprimentam-se novamente, no alto da pedra onde jaz duas pequenas traves de ferro, usadas para estaquear uma antiga caixa de cume, que marcava o cume da Torre dos Sinos.

Os aventureiros fazer o caminho de retorno, galgando as mesmas centenas de metros que andaram minutos antes, enfrentando a parede e a subida da trilha, chegando rapidamente até o cruzo da trilha principal.
Agora já com o terreno dominado, porém com o cansaço dominando-os, desenvolvem até o cume de mais um píncaro, atingindo as 15:10hs o 7º cume da empreitada. Mais um aperto de mãos na cabeça do felino do Marumbi, a Ponta do Tigre.  
Realizam a descida, sem visual, até o apartamento nº11 e dali realizam o desvio para a Esfinge. Comentam se deveriam deixar esse cume de fora. Roberto corajosamente comenta: “Número 7 é número de mentiroso! Vamos colocar os cumes restantes no bolso!"
Sobem sua parede escorregadia, passando ao lado da enorme greta que os ladeia. Envolto entre as nuvens, realizam seu ritual habitual às 15:48 hs na mítica Esfinge. Agora era hora de cuidados redobrados, pois o cansaço e o frio tomavam conta nos corpos açoitados dos dois montanhistas.
Desenvolvem a descida da parede da Esfinge vagarosamente e, uma vez mais no Apartamento nº11, entram no Desfiladeiro das Lágrimas. Eternamente molhado, é um ótimo local para despencar em caso de poucos cuidados. Logo a frente, embora não tenham contato visual, sabem que seu próximo destino está logo à frente, tal qual um monstro contorcido, pronto para engolir qualquer um que ouse desafiá-lo.
Já cambaleantes, alcançam o cruzo que os levaria para o píncaro do outeiro preferido de Roberto. Param, ponderam, argumentam, decidem!
Nesse trecho, estava marcado um longo descanso de duas horas, antes de cruzar morro acima. Seria hora de recarregar as energias, sono, hidratação, de últimos acertos.  Porém, Roberto comenta com Papael que já não tinha forças nas pernas, se ousassem parar pelo tempo estimado, ele não levantaria mais, porém, subiria nem que fosse se arrastando até o cume. O Abrolhos estava esperando-os.
E lá vão, com bravura, com os corpos em frangalhos, subindo a escarpada trilha para o "preferido". Roberto, puxando o peso do corpo apenas com os braços pois suas pernas pouco podiam ajudar, e Papael com palavras de incentivo, enchem o cume do Abrolhos com salvas e um abraço destemido, pisando às 18:20 hs os 1.200m do 9º cume, o Abrolhos.
Descem novamente ao cruzo, e agora mais tranquilos, fazer o retorno da bem conhecida trilha. Realizam a descida de forma contida, porém, com surpresa, veem que alcançaram as pedras do calçamento que marcam o início da Vila com menos de 2 horas de descida.
Com as roupas sujas e encharcadas, corpos surrados porém com sorrisos nos lábios; chegam ao ponto de partida, pontualmente às 20:15hs, coroando com louros as 16 horas que andaram. Cumprimentam-se, completando o ritual que haviam feito durante cada etapa, as mãos se tocaram mais uma derradeira vez, selando para a eternidade sua amizade. Brindam, sorriem, têm consigo que realizaram um grande feito. Têm consigo que combateram o bom combate e firmaram de vez a sua parceria por todo o sempre.
Talvez alguns montanhistas ou alguns atletas atuais, incautos, dirão que podem fazer esse trecho em metade do tempo ou menos. Alguns, quando a dupla comenta sobre a “Completíssima” afirmam: Mas eu fiz em 12 horas! E os protagonistas os respondem: “Todos os 9?” e esperam o olhar de dúvida que sempre surge na face dos seus inquisidores.
Desculpe se soar de forma arrogante, porém vou correr o risco:
Talvez faça... Duvido!
Porque, naquele fatídico ano de 2012, Roberto estava comemorando a juventude de seus 61 anos de idade.
E então, topa o desafio?